O mundo está vivendo um momento difícil, daqueles que nós ouvimos nas aulas de História, que pareciam distantes. Mas agora é real e atual. Como será que estaremos depois que isso passar? Compartilhamos a seguir uma crônica interessante de um jornalista e escritor italiano, publicada no jornal Corriere della Sera esta semana.
Tradução do artigo original por Italiano Easy

di Beppe Severgnini – 17 de março de 2020
Quando tudo isto acabar teremos diante de nós três adversários que nos darão trabalho. Será importante não esquecer aquilo que estamos aprendendo hoje.
Olhando as imagens dos habitantes de Paris em fuga da cidade, lembrei-me de um conto de Dino Buzzati cujo título é: “Aconteceu alguma coisa”. O protagonista está voltando de trem para Milão e percebe que todos vão na direção oposta: estão escapando, com todos os meios. Coloca a cabeça para fora da janela, pergunta. Todos correm, ninguém responde. Pega um jornal em uma estação, fica em suas mãos somente um canto da primeira página, as últimas letras de um título escrito em letras enormes: “…ÃO”. Todos escapam de alguma coisa que termina por “…ÃO”. Revolução? Inundação? Explosão? Invasão? Não se sabe. O trem corre em direção a essa coisa, seja ela qual for.
Infecção também termina por “…ão”. Hoje, também, muitos têm a tentação de largar tudo e escapar, diante da arrancada do Covid-19. Mas, a maioria dos milaneses, conterrâneos de Buzzati, hoje não escapa: resiste. É verdade, alguns têm tentado voltar para suas famílias, em outras partes da Itália. Incerteza e isolamento são uma combinação traiçoeira, que causa ansiedade. Mas é preciso raciocinar: o contágio é evitado com a separação temporária, não carregando-o de um lado para o outro.
Pânico contagia: mas nenhum número revela quanto. Eu me pergunto se muitas pessoas refletem antes de publicar alguma coisa nas redes sociais. Não falo dos fofoqueiros por profissão, para os quais não parece verdade ter um assunto assustador e um público para ser assustado. Não falo dos vira-casacas, aqueles para os quais, há uma semana, era tudo uma mentira e agora é o fim mundo. Não falo daqueles que Claudio Cerasa, no Foglio, chamou de «os abutres do Coronavírus»: pegam uma notícia ruim e espalham-na aos quatro ventos, convictos de que a mesma demonstre alguma de suas teses malucas. Falo de pessoas sérias e assustadas, incapazes de entender que o susto pode apagar a seriedade. Muitos trabalham na mídia (jornalistas, escritores, atores, diretores, cantores): nos perfis das redes sociais abandonam-se a lengalengas, propostas grotescas, comoções infantis, piadas de gosto duvidoso, intimidades inúteis, confidências indevidas. Uma maneira ingênua para se defender do pânico ou um modo inconsciente de difundi-lo?
Porque o pânico, como o vírus, é astuto: sabe como entrar dentro de nós.
Pensemos, ao contrário, em modo construtivo. É o que nos ensinam médicos e enfermeiros, o desespero é um luxo que eles não podem se permitir. Pensemos em como distribuir as máscaras com inteligência, logo que estejam disponíveis, dando a preferência para quem as necessita (para levar o cachorro na rua sozinho não são necessárias). Pensemos em como proteger os idosos. Porque o nosso modelo social os tornou mais vulneráveis. O papel dos avós nas famílias aproxima Itália e Espanha: talvez, não por um acaso, são os dois países onde a mortalidade é alta, em relação aos contágios.
Pensemos nas extraordinárias lições que estamos aprendendo e sobre a necessidade de não desperdiçá-las. No fim da emergência – que chegará, talvez antes do que imaginamos – teremos que lutar contra três adversários que nos darão trabalho: a inevitável recessão econômica, a previsível retomada das hostilidades políticas. Mas também a euforia, que é a irmã descabelada do pânico. Uma euforia que poderia nos levar à remoção: as semanas do vírus desaparecidas, como acontece com um sonho ruim pela manhã. Significaria desperdiçar uma experiência. E as experiências, principalmente aquelas difíceis e fatigantes, não devem ser desperdiçadas: ao invés disso, devem ser lembradas e estudadas.
É uma lição que a humanidade deveria ter aprendido depois de guerras e catástrofes. Mas, de vez em quando, a esquecemos.
Beppe Severgnini, é italiano, jornalista, ensaísta e colunista do jornal italiano Corriere della Sera.
Fonte: https://www.corriere.it/opinioni/20_marzo_17/emergenza-coronavirus-noi-parigi-milano-panico-l-euforia-1cc7f348-6872-11ea-9725-c592292e4a85.shtml

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